quinta-feira, 1 de julho de 2021

Rico (Πλοῦτος), de Aristófanes - RESENHA #162

Acaba de chegar às minhas mãos a última das comédias completas de Aristófanes. Rico é uma tradução de Pluto (388 a.C.), feita pelo Kleber Rocha, que, nos meus saudosos anos de faculdade, foi meu professor de Língua Grega, a disciplina mais temida do curso de Letras que, para alegria dos acadêmicos que vieram depois, foi removida da nova grade curricular.

Apesar de não ser um grande entusiasta do teatro grego clássico, não posso evitar aquela potinha de curiosidade que nós, os apaixonados da Literatura, sentimos pelas grandes obras da antiguidade. O estudo e leitura atenta que esses textos exigem, no entanto, acabam fazendo com que passemos outras leituras mais amenas à frente daquelas.

A tradução de Pluto, entretanto, chegou num momento em que as circunstâncias foram favoráveis à sua leitura; e, ainda que não tenha morrido de amores pela comédia de Aristófanes, pude dar algumas gargalhadas em algumas de suas passagens, como também apreciar a crítica que o comediógrafo lança a certos tipos da Grécia antiga.

O enredo da peça é o seguinte. Crêmilo é um agricultor que começa a se questionar sobre a maneira como deve educar seu filho. Ele reflete que os homens honestos e justos são todos pobres, enquanto os corruptos e trapaceiros não deixam de enriquecer.

Apresentando essa questão ao deus Apolo, Crêmilo o interroga se devia criar seu filho segundo a leviandade do mundo, para torná-lo rico. A resposta do deus é que Crêmilo, à saída do Oráculo de Delfos, seguisse o primeiro homem que encontrasse e o convencesse a levá-lo à sua casa.

O eleito acaba sendo um mendigo cego, a quem Crêmilo acompanha seguido de Carião, seu escravo, que, após interrogar seu senhor, acaba tomando conhecimento da situação. Os dois descobrem que o cego era na verdade Rico (Pluto), o deus da riqueza, que fora castigado com a cegueira por Zeus, para que fosse impedido de beneficiar exclusivamente os homens justos.

Crêmilo propõe devolver a visão a Rico em troca de que este o enriqueça. O acordo é selado e, para alcançar seu objetivo, o agricultor encaminha o cego ao templo do deus Asclépio. Conhecendo as pretensões de Crêmilo, a Pobreza tenta intervir, começando a partir daí um dos diálogos mais interessantes da peça, onde se reflete os malefícios do dinheiro na vida do homem, como também a ideia de que a pobreza estimula ao trabalho e à produção da Arte.

Outro fator interessante da peça é a reação dos “ricos” perante o plano de Crêmilo. Uma série de tipos são apresentados ao público, como a velha que sustenta um amante jovem e o sacerdote que vivia das oferendas dos religiosos.

O desfecho da peça leva-nos a refletir uma triste realidade que não deixa de ser atual: o endeusamento do dinheiro. Neste mundo capitalista em que vivemos, de fato, não são poucas as pessoas que julgam-se umas às outras tendo em vista a riqueza material. Quando paramos para pensar que no século IV a.C. já era assim, entendemos que mudam-se os costumes, mas jamais os homens.

Avaliação: ★★★

Daniel Coutinho

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