sexta-feira, 14 de maio de 2021

A Torre em Concurso, de Joaquim Manuel de Macedo - RESENHA #158

Joaquim Manuel de Macedo tinha certa queda pela sátira política, como bem demonstram suas obras A Carteira de meu Tio e Memórias do Sobrinho de meu Tio. Era pois comum que a pena do sátiro fosse emprestada ao dramaturgo, e daí nascesse A Torre em Concurso (1861).

Esta é sem dúvida uma das peças mais interessantes do teatro macediano. Embora a crítica ácida que se faz na comédia seja suavizada pelas cores vibrantes do Romantismo, A Torre em Concurso não encobre sua intenção política de conscientizar o povo brasileiro.

Num curato de uma das províncias brasileiras, lança-se um edital pelo qual se busca um engenheiro “inglês” para levantar a torre do sino da igreja local. Os engenheiros nacionais ficam descartados “porque todos eles juntos não valem o dedo mindinho de um engenheiro inglês” (pág. 176).

Aproveitando-se do fato de que a população do curato não domina o idioma estrangeiro, dois impostores (foragidos da polícia) candidatam-se ao cargo e são submetidos a uma eleição. Lord Gimbo (Crespim) e Mr. Matracoat (Pascoal) conhecem-se, mas ficam impedidos de acusarem-se um ao outro e preferem aguardar pela decisão popular.

Em outro núcleo de personagens, temos Faustina, que ama o engenheiro Henrique, mas este é constantemente assediado por Ana, a tia velha de Faustina. Quando a megera descobre os interesses do jovem casal, convence seu irmão João Fernandes, juiz de paz do curato, a casar a filha com o engenheiro eleito.

A partir daí, Macedo emprega todo o seu humor ácido na explanação da campanha dos “engenheiros ingleses”. Ambos ganham seu time de apoiadores pelos motivos mais fúteis possíveis. Antes do interesse comum (a construção da torre) está a necessidade pessoal de poder político.

O dramaturgo compõe cenas bastante cômicas protagonizadas por um juiz analfabeto, por um subdelegado corrupto e por uma solteirona despeitada que se torna cabo eleitoral a fim de casar a sobrinha com o candidato mais feio da disputa. A par disso estão todos aqueles casos clássicos de fraude eleitoral, como compra de votos, eleitores invisíveis, imparcialidade política etc.

É triste pensar que A Torre em Concurso permanece atual para nosso tempo, tendo em vista que o fantasma da corrupção continua atormentando nosso país. É pena também que um texto desta qualidade esteja tão esquecido pelos leitores contemporâneos, pois, a meu ver, seu conteúdo seria relevante até mesmo para estudo no ensino básico.

Avaliação: ★★★★

Daniel Coutinho

 ***

Instagram: @autordanielcoutinho

SKOOB: http://www.skoob.com.br/usuario/1348798
Escreva para o blog: autordanielcoutinho@gmail.com

3 comentários:

  1. Incrível como algo de 1863 está, infelizmente, cada dia mais atual em nossa sociedade. :(

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. É uma triste verdade, mas muita coisa não mudou de lá pra cá.

      Excluir
    2. Ah, e eu corrigi um pequeno engano. A peça na verdade é de 1861.
      Em 1863 ela foi editada em livro ;)

      Excluir