segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

A Ilha Maldita, de Bernardo Guimarães - RESENHA #41

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Li A Ilha Maldita, pela primeira vez, em 2009, e recentemente me deu uma grande vontade de reler esse encantador romance de Bernardo Guimarães. A experiência, como já previa, foi maravilhosa, mas o mais impressionante era o quanto eu me lembrava da história. Geralmente, tenho péssima memória para lembrar das histórias que leio, de maneira que, sinceramente, teria dificuldade em contar o enredo de um livro lido há um ou dois meses. D’A Ilha Maldita, lido há quase dez anos, lembrava de praticamente tudo, e lembrava com carinho!

Até pouco tempo, estava inconformado com o fato de ser esse livro tão ignorado pelo grande público. Mas, felizmente, isso parece estar mudando. O blog “Sobre o medo”, por exemplo, disponibilizou, pela primeira vez na internet, a obra completa em PDF para download. Imagino que isso tenha possibilitado um maior conhecimento sobre a história da bela Regina. Mas o que me deixou mais feliz mesmo foi saber (e soube há pouco) que A Ilha Maldita ganhou uma nova edição em 2016, pela editora Bira Câmara. Embora lançado numa tiragem limitada e por uma editora independente, já é alguma coisa, né? Claro que já fiz pedido de um exemplar dessa nova edição, mas ainda não chegou (Mostrarei no Mais Livros! de janeiro, ok?). Quem se interessar por adquirir o livro, entre em contato com a editora, pelo e-mail “jornalivros@gmail.com”.

A Ilha Maldita conta a história de Regina, uma garota que foi acolhida por Felisbina, uma viúva que a encontrou na beira da praia, quando Regina era só uma criança. Tida como náufraga, Regina passa a viver na choupana da viúva numa pequena aldeia de pescadores.

Desde pequena, Regina demonstra grande interesse por tudo relacionado ao mar, desejando inclusive ter um barco com que possa navegar à sua boa vontade e quem sabe até alcançar a ilha maldita, que é uma porção de terra rodeada por penedias em torno das quais o mar está sempre agitado. Essa misteriosa ilha nunca foi alcançada por nenhum pescador. Conta-se que quando alguém se aproxima dela, a mesma vai se afastando, além dos terríveis escarcéus que a rodeiam tornarem a ilha praticamente inacessível. As histórias e lendas ouvidas por Regina aguçam sua curiosidade, mas os cuidados da boa Felisbina a impedem de realizar seu desejo.

Quando Regina cresce, torna-se no que chamam de femme fatale. A bela morena dos olhos verdes é a mulher mais cobiçada da região e leva à loucura todos os homens que têm a desdita de olhá-la. De sua parte, Regina parece não ter nenhuma tendência para o amor; por isso, ignora todos que lhe declaram paixão arrasadora. Contrariados, os pretendentes de Regina vão-se embora da aldeia para tentar esquecê-la, ou acabam cometendo suicídio. Esses trágicos acontecimentos fazem com que todos acreditem que Regina é uma espécie de fada malfazeja ou mesmo sereia, no dizer de alguns.

A morte de Felisbina acaba dando mais liberdade à Regina, que finalmente poderá realizar seu desejo de chegar à ilha maldita. E isso de fato acontece, sendo ela a única capaz de fazê-lo. O ocorrido não gera maior espanto, porque todos, a essa altura, já têm em conta que Regina é uma criatura sobrenatural, uma filha do diabo. O que surpreende todos mesmo é a decisão tomada pela moça de casar-se com Aleixo, um marinheiro desconhecido que aportou naquelas praias. Esse casamento é festejado como um acontecimento da mais elevada importância, pois todos acreditam que tal ocorrência porá termo às desgraças frequentes relacionadas à fatal Regina. Eis que na noite de núpcias, Aleixo é assassinado. No dia seguinte, a cabana de Regina está vazia. Todos pensam que o pobre moço foi mais uma vítima da sereia, mas a verdade é outra. E quem quiser saber o que realmente ocorreu, claro, terá que ler o livro!

A Ilha Maldita tem uma estrutura bastante folhetinesca, tendo uma narrativa aparentemente toda amarrada desde o princípio por seu autor. O romance obedece a uma sequência muito direta e até previsível em vários momentos. Mesmo tendo uma linguagem bastante trabalhada, não consigo encará-lo como obra destinada ao público adulto, não necessariamente por seu caráter fantasioso, mas pela forma de condução executada por Bernardo Guimarães, que lembra a narrativa infantojuvenil. Fosse este livro “traduzido” para o português moderno, penso que faria relativo sucesso com o público jovem, em razão de seus vários elementos atrativos: mistério, aventura, fantasia e até uns toques de terror.

O crítico Dilermando Cruz, no seu perfil bio-biblio-literário de Bernardo Guimarães, considerou A Ilha Maldita um romance excelente e primoroso, lamentando, como eu, o pouco valor atribuído à obra, que ainda tem o mérito de provavelmente ser o primeiro romance fantástico da Literatura Brasileira. Posso até estar enganado, mas não consigo lembrar de nenhum romance fantástico brasileiro publicado antes de 1879, pois devemos lembrar que Noite na Taverna não é exatamente um romance. Sendo assim, este mérito, embora jamais atribuído pela crítica, cabe ao celebrado autor de A Escrava Isaura, nosso eterno Bernardo Guimarães.

Avaliação: ★★★★★

Daniel Coutinho

P.S.: Uma curiosidade apenas! Em 1942, a Editora Brasileira publicou A Ilha Maldita sob o título A Filha das Ondas (em edição de bolso), provavelmente por motivos comerciais, talvez por acharem este último título mais atraente. Fiz a releitura nessa edição de bolso, pois minha outra edição (Jornal do Brasil, 1930) tem uma letra bastante minúscula.


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