quarta-feira, 22 de maio de 2019

Um Casamento no Arrabalde, de Franklin Távora - RESENHA #96

Curioso como, muitas vezes, um livro despretensioso causa mais impressão que muita trama mirabolante! Assim é Um Casamento no Arrabalde (1869), de Franklin Távora. Não obstante ser uma de suas obras menos conhecidas, apresenta uma narrativa construída com muita graça e simplicidade.

No enredo temos dona Emília, uma senhora de elevada instrução que, cansada de receber maus tratos do marido, toma a decisão ousada (para sua época) de abandoná-lo, levando consigo sua filha Lucila, com quem vai viver num pitoresco arrabalde. Graças a seu ilustrado conhecimento musical, dona Emília logo se emprega como professora da filha de Luiz Correia, senhor de engenho e subdelegado de polícia do lugar.

Lucila e Pedro (filho de Luiz Correia) acabam se apaixonando um pelo outro, mas a união dos dois não é aceita pelo pai do moço por questões sociais. Embora dona Emília demonstre uma postura de honra, sua condição de mulher separada, como também suas ideias adiantadas sobre sociedade, acabam por torná-la mal reputada sob vários aspectos. A única solução para a felicidade dos jovens seria um casamento oculto.

Para tal realização, dona Emília solicita a ajuda de Túlio, bacharel em Direito, cujas ideias são bastante compatíveis com as da mãe de Lucila. Desse contato, porém, surge um sentimento inesperado entre eles, de maneira que, enquanto tentam levar a cabo o consórcio do jovem casal, buscam lidar prudentemente com as próprias emoções.

Pondo de lado os elementos passionais, temos em Um Casamento no Arrabalde excelente demonstração da ideia de igualdade entre as raças. O posicionamento de dona Emília a este respeito é o artifício para divulgar opiniões como a seguinte: “O homem é simplesmente o homem. Seja qual for a sua origem, clara ou obscura, ele tem direito absoluto à liberdade, à instrução, às posições e distinções. O essencial é saber se ele tem merecimento por onde chegue a estas distinções e posições. O merecimento no negro torna este superior ao branco sem merecimento.” (pág. 23).

O traço regionalista também é digno de nota, não escapando ao autor a descrição do interior pernambucano e a pintura de alguns tipos provincianos. É com humor e graça que são pintadas algumas cenas de destaque, como a da confissão de Lucila, em que a ausência de um confessionário próprio ao ato repercute numa situação embaraçosa e cômica.

Mesmo o livro seguindo sem grandes surpresas, com um final antecipadamente advertido, a construção singela que seu autor lhe dá torna a experiência suficientemente satisfatória, não havendo muita brecha para reparos. É em suma uma novelinha agradável para ser lida numa única tarde por “quem não tiver que fazer” rs.

Avaliação: ★★★★

Daniel Coutinho

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