Entusiasmado que fiquei com a escrita de
Stacpoole, quando li ano passado A Lagoa
Azul, ansiava urgentemente ler mais alguma coisa do autor. Ainda
entristecido por não poder ler os outros dois livros da trilogia de Emelina e
Dick, acabei localizando este romance de aventuras publicado no Brasil em 1956
pela editora Edigraf: Os Dois Sósias
(The Man Who Lost Himself, 1918).
Mesmo assinado por Stacpoole, o livro não
parecia grande coisa, a julgar pela qualidade da edição. O título bem diverso
do original também me sugeriu uma tradução malcuidada. Mas como era tudo o que
me restava deste maravilhoso irlandês, não podia deixar passar rs! E para minha
grande surpresa (ou nem tanto assim), acabei adorando o livro. Simplesmente divertidíssimo!
Os Dois
Sósias, diferente d’A Lagoa
Azul, é obra mais ligeira e despretensiosa, mas de leitura tão agradável e
cativante, que estou convencido de que Stacpoole tem sido negligenciado pelo
público brasileiro. Ainda que tenha lido por uma edição de bolso com letra
pequeníssima e numa tradução um tanto problemática, pude vislumbrar o talento
inquestionável do autor. Dentre outras surpresas, o enredo me fez pensar que
talvez Inés Rodena tenha se inspirado nesta obra para criar a trama de La Usurpadora. Quando passarmos ao
enredo, este ponto estará devidamente esclarecido. Que seja pois já rs!
Vitor Jones é um jovem americano que não tem
tido sorte na vida. Uma recente relação profissional o leva para território
inglês onde mais uma vez a sorte se lhe apresenta adversa. Desgostoso de tanto
insucesso, acaba conhecendo um homem que mudará sua vida inteiramente: o conde
Artur Rochester, seu perfeito sósia. Este, primeiro a se dar conta da incrível
semelhança entre os dois, decide festejar a descoberta com Jones.
No dia seguinte, Jones acorda num lugar onde
nunca esteve antes. Ele só lembra de ter sido carregado bêbado para aquela
residência que logo reconhece ser a mansão do conde de Rochester. Uma porção de
criados logo o cerca de cuidados e atenções com os quais ele nunca sonhara.
Todos o tomam pelo conde. Embora julgando-se vítima de uma brincadeira, o
verdadeiro conde não se manifesta. Uma notícia de jornal notificando a morte de
um americano identificado como “Vitor Jones” convence o verdadeiro Jones de que
fora o conde de Rochester, o responsável pela troca, quem realmente acabara
falecendo.
O conde, contudo, tivera tempo de deixar uma
carta para seu sósia, pedindo-lhe que se aguentasse em seu lugar. Assustado com
a situação, receoso de complicar-se ainda mais e sem um níquel no bolso, Jones
prefere calar a verdade e continuar representando o papel do sósia. Não
imaginava, contudo, que Rochester fosse um estroina de péssima reputação,
cercado de más companhias e, ainda por cima, infiel à esposa.
Para sua surpresa (e do leitor), Jones assume a
identidade do sósia de tal forma, que reage às consequências da vida dele, como
se fosse a sua própria, chegando mesmo a confundir-se ocasionalmente sobre sua
personalidade. Tudo o que era indiferente a Rochester é encarado com
austeridade pelo sósia que logo propõe-se a reparar todos os erros daquele cujo
lugar usurpava. Como se não bastassem tantos problemas de natureza diversa,
Jones ainda sente-se inevitavelmente atraído por Teresa, a esposa do conde, que
não obstante os inumeráveis defeitos do marido, ainda o ama. Digam se vocês não
viram essa novela de Gabi Spanic rs?
Admito que mesmo envolvido com as peripécias
aventurescas da trama, não podia deixar de rir-me da situação, como que
desdenhando de uma história improvável que não fazia mais que me divertir. Mas Stacpoole,
prevenido de leitores como eu, acaba fazendo uso de um recurso com o qual não
contava. Em poucas palavras, ele cria uma situação que obriga o leitor a dar
crédito à sua improvável narrativa. O que parecia inverossímil acaba sendo
aceitável. Essa obstinação do autor por fazer crível seu enredo fez a obra
crescer consideravelmente em meu conceito.
No mais, só compartilho de uma impressão curiosa
que tenho observado em relação a romances de aventura. Esse ritmo acelerado que
os caracteriza chega a me aturdir. Talvez por estar habituado a leituras que
refletem as situações mais atentamente e que, portanto, são mais lentas, fico
quase ofegante com esse correr de cenas e acontecimentos apressados. Ainda que
me divirta com as situações, elas acabam me cansando também, pela velocidade
com que transcorrem na obra.
Desejaria muito ver Stacpoole sendo reeditado aqui
no Brasil. É autor de estilo agradável e envolvente, seja pela sedução poética
d’A Lagoa Azul, seja pelo movimento
excitante d’Os Dois Sósias.
Avaliação: ★★★★
Daniel Coutinho
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