Conheci a
literatura de Regis Castro por volta dos meus quinze anos, através do romance Raïssa, leitura da qual, hoje tenho
certeza, deixei escapar muita coisa. Regis é mais conhecido por seus diversos
livros católicos, alguns deles escritos em parceria com Maïsa Castro, sua
esposa. No que se refere à prosa de ficção, além de Raïssa, publicou outros três romances: Croma, Caminho de Vida (1967), Barby
e Pique.
Regis, a meu
ver, pertence ao rol daqueles escritores injustiçados, já que suas qualidades
literárias são inquestionáveis. Sua escrita cuidadosa e delicada merecia mais
atenção do público e da crítica, e, talvez por esse descaso para com sua ficção,
o escritor tenha engavetado sua pena de romancista.
Croma, Caminho de Vida (posteriormente publicado como Croma, um Caminho para a Vida) é seu
romance mais conhecido, tendo ganhado várias reedições. Conta a história de
Fernando Torres, um seminarista prestes a realizar seus votos sacerdotais. Para
este fim ele embarca no navio Croma, rumo a Itália, mas seu companheiro de
cabine, o psicanalista Álvaro Ruiz, convence-o a encarar uma experiência que
põe à prova a vocação de Torres.
A
experiência consiste em omitir as intenções religiosas do seminarista,
fazendo-o passar por um rapaz comum no navio. Em pouco tempo, ele trava diálogo
com Odete, uma jovem interessante, órfã de pai, que dedica-se à poesia a fim de
escapar da relação conflituosa com a mãe, mulher exigente que discrimina todos
os pretendentes da filha.
Ruiz, ao
tomar conhecimento da nova amizade de Torres, alerta-o para a necessidade de
que o mesmo não se prenda exclusivamente aos encantos de Odete,
incentivando-lhe outras relações. Seguindo o conselho do médico, o moço acaba
conhecendo Rosely, uma jovem em tudo diferente de Odete, a despeito de seus
muitos atributos físicos.
Enquanto mantém
contato com as duas moças, Torres, durante as refeições, conta a Ruiz a
história de sua vida, tentando esclarecer os motivos que determinaram seu
desejo de querer tornar-se padre. A experiência proposta pelo médico, no
entanto, deixa-o numa difícil encruzilhada: escolher entre suas inclinações
sentimentais e religiosas.
A narrativa
de Croma é muito bem conduzida quase
que em sua totalidade. O autor constrói um ritmo interessante ao intercalar a
experiência de Torres com a história de sua vida, mostrando as decepções do
passado, seus amores frustrados, seu instinto filantrópico e suas dúvidas em
relação ao futuro, a qual caminho seguir.
Senti,
contudo, o final um tanto apressado que, mesmo não sendo incoerente, poderia
ter sido melhor desenvolvido. A rapidez com que Torres muda de ideia nos
momentos finais do romance é sem dúvida o ponto mais questionável do livro.
Mas, não obstante este ou aquele senão, a obra de Regis Castro revela o grande
talento de um prosador que merecia ser mais lido.
Avaliação: ★★★★
Daniel Coutinho
***
Instagram:
@autordanielcoutinho
Escreva para o blog: autordanielcoutinho@gmail.com
Li Raissa há muitos anos, quando frequentava assiduamente a igreja. Não sabia que o autor tem outros livros, e Croma me pareceu um tanto interessante. Fiquei curioso e mais curioso ainda quando vc disse que pretendia escrever sobre o tema. Rsrs
ResponderExcluirPreciso reler "Raïssa", pois não era maduro suficiente para entendê-lo quando o li. "Croma" é um ótimo livro e rapidinho de ler. Uma pena que Regis seja tão pouco conhecido enquanto ficcionista.
ExcluirOlá, Daniel. Tomei conhecimento do seu blog justamente procurando alguma coisa na Internet sobre o Régis Castro. Impressionante como não se acha UMA biografia do homem, UMA foto dele ou qualquer coisa semelhante minimamente a uma notícia. Realmente, pode-se dizer que ele foi sumamente ignorado pela crítica literária. Desconfio que a razão foi ele ter se vinculado demais à literatura dita "religiosa", e sabemos que escrever sobre o tema só traz sucesso quando envolve alguma polêmica (principalmente envolvendo papas e os altos escalões do Vaticano, momento em isso se torna mais "literatura conspiratória" do que "religiosa" mesmo).
ResponderExcluirSeja como for, todos nós que lemos seus livros o fizeram numa época inglória: nessa adolescência turbulenta em que a gente mais pensa que sabe do que realmente sabe. Li Raïssa e Croma nessa época (também pelos meus 15 ou 16 anos) e achei - naquele tempo! - o primeiro sonolento e sem atrativos e o segundo um porre. Hoje, relendo-os (tenho os dois ainda lá na casa paterna), vejo como são profundos, como tratam de temas relevantes e como Régis é um escritor que consegue passar essas histórias de modo leve, cativante e emocionante. É terminar de ler e sonhar/refletir sobre tudo que ele disse.
Obrigado por essa bela resenha e por trazer visibilidade ao autor e sua obra.
Ah, que bom que gostou da resenha! Os trabalhos literários do Regis foram realmente injustiçados e precisavam ser mais conhecidos. Tão logo seja possível, devo reler e resenhar "Raïssa". Também pretendo ler os outros dois romances do autor. Não há muita informação sobre o Regis na internet, mas, no site a seguir, você poderá ver fotos dele com sua esposa Maïsa, além de encontrar alguns dados biográficos. Espero ter ajudado. Um abraço!
Excluirhttps://comunidadejesusteama.org.br/comunidade/historia-da-comunidade/