sexta-feira, 14 de agosto de 2020

Lampião, de Rachel de Queiroz - RESENHA #140

Depois de ter esgotado a obra romanesca de Rachel de Queiroz, decidi me aventurar pelo teatro da autora de O Quinze. Para os palcos nossa Rachelzinha escreveu Lampião (1953), objeto desta resenha, e A Beata Maria do Egito (1958), da qual falaremos na próxima postagem.

Dentre minhas particularidades de leitor, no que se refere a gosto pessoal, está o fato de que não simpatizo com histórias cujo tema central é o banditismo. Certamente por isso não apreciei tanto quanto desejava o Memorial de Maria Moura.

Lampião, conquanto seja uma figura representativa que conquistou o imaginário popular, não me representa enquanto nordestino. Não tenho nenhuma admiração por ele e não posso mesmo entender o fascínio que algumas pessoas sentem perante sua imagem asquerosa. Foi um bandido idiota que morreu como um porco. Nada mais.

Só mesmo a criadora de Dôra, Doralina para me fazer acompanhar alguns dos episódios mais lendários do famigerado cangaceiro pernambucano. A peça Lampião é divida em cinco quadros cheios de ação e violência. Por ela temos uma imagem bem próxima do que fora realmente o Rei do Cangaço. Rachel explora ainda com propriedade a também lendária figura de Maria Bonita.

A peça se inicia justamente com o episódio no qual Maria Déa abandona o marido e os filhos para seguir Lampião, tornando-se a partir daí Maria Bonita, a mulher do terrível bandido. Nos quadros seguintes acompanhamos o cangaceiro e seu bando em suas peregrinações pelo sertão.

Lampião, na tentativa de livrar-se da perseguição do governo, tenta um “acordo de paz” enviando uma carta para o interventor de Recife através de dois viajantes que são abordados por seus homens. Além da expectativa pela resposta, acompanhamos os conflitos que se desdobram entre os cangaceiros, os principais deles envolvendo Antônio Ferreira e Ezequiel, irmãos de Lampião.

Lampião é uma peça movimentada e bastante violenta. Embora o tema não me empolgasse, não pude deixar de apreciar a maestria com que Rachel organiza cada um dos quadros, cujo principal defeito, a meu ver, é a desproporção. Mesmo assim temos uma sequência muito pertinente e coerente para uma apresentação teatral.

No que diz respeito ao texto da peça, pareceu-me desnecessário o acúmulo de detalhes e informações. Rachel especifica até as aves que devem cantar em determinadas cenas, além de enumerar minuciosamente objetos e acessórios de palco, vestuário, etc. Não acredito que os cenógrafos e figurinistas sigam à risca tantos pormenores numa possível montagem. Defendo a ideia de que o dramaturgo deve estar mais focado na construção das falas e na sequência cênica, minimizando ao máximo os aspectos suplementares, concedendo assim mais liberdade artística às companhias teatrais.

Rachel de Queiroz revela-se com Lampião uma excelente dramaturga. Eu certamente teria apreciado mais seus dotes teatrais a partir de um tema mais ameno. Vamos ver se encontro algo do tipo na segunda e última peça que ela escreveu. Mas isto será matéria para outra publicação rs. Encontro vocês lá!

Avaliação: ★★★

Daniel Coutinho

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