quinta-feira, 28 de março de 2024

O Matricida, de Alfredo Bastos - RESENHA #207

Desde que li Fantasias, fiquei bastante interessado na obra do paraense Alfredo Bastos. Seus contos, sutis e elegantes, causaram-me uma boa impressão. Além dessa obra, porém, a única publicação dele a que tive acesso foi este romance O Matricida, publicado em folhetins da Gazeta da Tarde entre 8 de novembro de 1880 e 14 de março de 1881. Saiu em formato de livro somente em 2022, pela Editora Oitocentista.

Aqui, devo confessar, a impressão já não foi tão positiva. O livro não chega a ser ruim, mas o enredo, o ritmo e principalmente os personagens não caíram no meu gosto. O Matricida se aproxima mais do folhetim francês, e dificilmente percebemos nele marcas dos nossos costumes. Essa capa de estrangeirismo possivelmente foi uma escolha proposital, a fim de atender ao gosto da época.

O livro é praticamente sobre a perversão e vingança de uma mulher. Alice é uma jovem simples que vive unicamente na companhia de sua mãe. Seduzida por Antão, acaba fugindo com ele, acreditando numa promessa de casamento. Ao perceber que fora enganada e abandonada, decide voltar para sua antiga casa, mas logo descobre que sua velha mãe morrera de apoplexia.

Desolada e com a honra perdida, Alice decide assumir uma nova identidade. Aproveitando-se de seus conhecimentos musicais, torna-se Julieta Alloni, professora de piano; mas, quando a farsa se descobre, decide partir para a Europa, onde descobre que está grávida de Antão.

Após dar à luz um menino, faz acordo com uma criada, recomendando-lhe que entregue a criança a uma família de agricultores. Pouco depois, Alice é descoberta por um empresário teatral, que promete torná-la uma cantora famosa. Daí, ela decide mudar de identidade mais uma vez, passando a ser Elisa Alcoy, uma cantora cubana que, em poucos anos, torna-se uma sensação mundial.

Após essa mudança de vida, Elisa procura Gastão, seu filho, passando-se por sua tia. Por conta de sua agenda com muitas viagens, a cantora matricula o “sobrinho” num colégio interno, partindo logo em seguida para sua turnê pelo Rio de Janeiro, onde reencontra Antão, que não a reconhece.

O antigo sedutor tenta se reaproximar de Alice/Elisa, ignorando completamente sua verdadeira identidade. A partir daí, a cantora começa a alimentar seus desejos de vingança, o que só será possível anos mais tarde, quando o próprio Gastão, já homem feito, poderá auxiliá-la.

Como visto, a trama realmente apresenta um formato bem folhetinesco, mas a galeria de personagens chega a ser tão desprezível, que o romance me parecia intragável em alguns momentos. Antão é um sedutor miserável e egoísta. Alice deixa-se corromper pela fatalidade e torna-se uma mulher fria, vingativa e vaidosa. Finalmente, Gastão desenvolve um péssimo caráter, sendo capaz de cometer os atos mais infames.

Há um núcleo que prometia melhorar a situação do livro: o do mordomo norte-americano James Burtley. Antão o contrata para administração do seu palacete, ignorando que Burtley possui família. A sogra e a filha vivem numa casa alugada pelo mordomo, que as visita sempre que possível. Mary, a filha de Burtley, acaba tornando-se interesse amoroso de Gastão. Infelizmente não aprovei o desenvolvimento e desdobramentos feitos pelo autor para este núcleo.

O Matricida é pois destes livros onde a maldade está sempre em evidência, podendo por isso desagradar leitores como eu. Acho que tal fator acaba sendo mais prejudicial numa obra de entretenimento, que não busca investigar ou refletir as mazelas descritas. Repito que não é um livro de todo ruim, mas certamente está muito longe de ser agradável.

Avaliação: ★★

Daniel Coutinho

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