Figura
notável de seu tempo, Maria de Lourdes Teixeira foi uma premiada escritora
paulista que se dedicou ao jornalismo e à literatura. Embora esquecida
atualmente, sua obra teve considerável êxito no século passado; dois de seus
romances ganharam o Jabuti, sendo um deles, O
Pátio das Donzelas (1969), adaptado para a TV em 1982.
O Banco de Três Lugares é o romance de estreia da ficcionista, que o
publicou em 1951 através da lendária Coleção Saraiva, que já havia divulgado um
ano antes A Ladeira da Memória, de
José Geraldo Viera, com quem Maria de Lourdes contraiu segundas núpcias.
Escrito numa
linguagem sobejamente poética, O Banco de
Três Lugares vale mais pela beleza de sua escrita que por seu enredo
praticamente inexistente. Essa percepção me trouxe o seguinte questionamento: O
que vale mais num romance, o enredo ou a escrita?
Já li
romances pessimamente escritos, mas que prenderam minha atenção pelo atrativo
do enredo. O contrário também já ocorreu, como no caso desta última leitura. A
qualidade da escrita de Maria de Lourdes é inquestionável. A autora ainda tem o
mérito de alcançar o requinte e o refinamento sem cair na obscuridade e no
preciosismo de certos prosadores. Mas o que dizer do enredo deste livro?
Fraquíssimo.
Cheguei pois
à conclusão pessoal de que enredo e escrita não estão num mesmo nível de
importância. Tal como o som é fundamental à poesia, o enredo é a alma do
romance, sobrepondo-se portanto à escrita que, embora importante, fica entretanto
abaixo daquele. Em suma, isoladamente, enredo e escrita pouco valem, mas o
primeiro sempre valerá algo mais.
Não bastasse
a falta de enredo n’O Banco de Três
Lugares, a narrativa em primeira pessoa revela-se incoerente por atribuir
uma linguagem altamente reflexiva e sofisticada para uma menina de dez anos. No
capítulo IX, por exemplo, Milena reflete: “Se os pais as mais das vezes pela
vida em fora pouco sabem da alma e do coração dos filhos apesar da convivência,
por sua vez e com maior facilidade escondem destes uma realidade interior que,
mesmo quando certas circunstâncias tornam aparentes, nunca assumem seu
verdadeiro caráter. As consequências então, o que disso pode decorrer para a
existência doméstica e individual, não há intuição infantil que consiga
apreender.” (Pág. 119). É o discurso de uma menina de dez anos? Não. É o
discurso de uma escritora de quarenta.
Milena
pertence a uma família rica que reside num casarão com vários empregados ao seu
dispor. Seu pai é um grande industrial e sua mãe uma talentosa pianista. A
harmonia familiar se altera, no entanto, quando o feliz casal começa a ter um
comportamento estranho e uma série de discussões. Pouco depois, Milena é
mandada para a fazenda de uma amiga de seus pais e, posteriormente, para um
internato de freiras.
A garota não
consegue entender o porquê daquela atitude intempestiva dos pais, como também o
motivo destes partirem para a Europa sem se despedirem. No isolamento do colégio
interno, recebendo espaçadas visitas do motorista da família, Milena sente-se solitária,
principalmente no período de férias. Nessas circunstâncias, ela rememora os
últimos acontecimentos, na tentativa de solucionar o perturbador mistério que a
distanciou de todos.
Acompanhar o
sofrimento de Milena em seu isolamento é tão entediante quanto estar sozinho
num internato de freiras. Mesmo suas lembranças são repetitivas e quase sempre
desinteressantes. Há beleza sem dúvida no fraseado de Maria de Lourdes, mas o
efeito da leitura valeria por uma longa sessão de ASMR. O problema é que a
gente não pode dormir rs.
Eu realmente
não recomendaria a leitura deste livro, a não ser àqueles que estejam com
dificuldades de conciliar o sono. Mas não desisti da autora e pretendo ler
ainda O Pátio das Donzelas. Será uma
boa ideia?
Avaliação: ★★
Daniel Coutinho
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Esse foi o único que abandonei dos livros que li da coleção Saraiva. Imaginei que fosse excelente como alguns da coleção, de autores nacionais já esquecidos.
ResponderExcluirEle é bem chatinho mesmo hehe, embora tenha uma escrita bonita e poética.
Excluir"Banco de três lugares", embora tenha sido o primeiro livro dessa grande autora, realizou a façanha de esgotar sua primeira edição vendendo, num único ano, 43 MIL exemplares (num Brasil que, em 1951, possuía metade dos habitantes que possui hoje). Foi por esse sucesso de público que Maria Lourdes se tornou uma autora importante (e não poque ganhou Jabuti). Infelizmente, no meio "crítico" literário atual, os "entendidos" andam mais inclinados a louvar os lixos... quer dizer, os livros de uma Clarice Lispector (todos fracassos de venda). É por isso que o público cada vez mais vira as costas para a arte.
ResponderExcluirVocê só não levou em conta o fato de que o livro foi publicado num clube de assinatura. A "Coleção Saraiva" já estava circulando há alguns anos com bastante sucesso. Desse modo, era inevitável que a tiragem se esgotasse rapidamente, devido à fidelidade dos assinantes.
ExcluirQuanto a Clarice Lispector, sua obra tem resistido ao tempo, sendo publicada ininterruptamente no Brasil, além do sucesso no exterior.
Reveja seus conceitos, querido. Pela sua lógica, o valor da obra de arte dependeria mais de vendagem do que de qualidade artística. Abraço!