Júlia Lopes de Almeida tem crescido em meu
conceito a cada nova leitura que faço de sua produção ficcional. Cruel Amor e A Intrusa me causaram excelente impressão; com A Falência (1901), a experiência não foi menos interessante. Mas
curioso mesmo é serem estas três obras tão distintas entre si, ao ponto de não
parecerem saídas da mesma pena.
A
Falência é o romance mais festejado de D. Júlia, tanto pela crítica
como pelo público. Nele a autora dispõe de tantos elementos interessantes, que
dali poderia ter saído obra de maior vulto, seja em qualidade, seja em
extensão. É um panorama delicioso o que a autora nos entrega nas páginas de seu
romance, tão habilmente conduzido, que, uma vez imersos na trama, somos
incapazes de abandoná-la.
Francisco Teodoro é um negociante português que
fez fortuna no Rio de Janeiro através do comércio do café. Casou-se com Camila,
uma moça humilde e formosa com a qual teve cinco filhos, tendo sobrevivido quatro:
Mário, Ruth e as gêmeas Lia e Raquel. Além da criadagem, também vive no
palacete da família a jovem Nina, órfã de mãe e filha do Joca, irmão de Camila
que reside em Sergipe.
Teodoro, orgulhoso de sua fortuna, ocupa-se
inteiramente de seus negócios, demonstrando ciúmes pela preferência que vem
ganhando o Gamas Torres, seu concorrente. Camila, insatisfeita no casamento,
mantém um caso extraconjugal com o Dr. Gervásio, médico da família. Mário
esperdiça o dinheiro do pai com amantes interesseiras, ignorando a paixão de
sua prima Nina; Ruth possui inclinações artísticas e dedica-se principalmente à
música; as pequenas Lia e Raquel alegram o ambiente com suas correrias e
travessuras infantis.
Dentre os muitos frequentadores da casa,
destaca-se o capitão Rino, moço aventureiro que nutre um amor platônico por
Camila, que não o corresponde. Possui uma única irmã, Catarina, que vive na
companhia da madrasta, permanecendo solteira por opção. Outro núcleo explorado
pela autora compreende as tias de Camila: Joana e Itelvina; a primeira é uma
carola incurável, a outra uma mulher avara e ríspida; vive com elas a pobre
Sancha, sempre vítima de maus tratos e agressões.
É simplesmente magistral a condução que D. Júlia
dá a esse fascinante panorama, explorando acertadamente todos os personagens
sob calculada medida. Mas todos parecem tão interessantes, que passam aquela
sensação de insuficiência. Afora o núcleo dos comerciantes de café, todos os
demais me deixavam bastante envolvido com as situações vivenciadas.
A autora, já amparada por este formidável
elenco, desenha cenas e situações de esmerado gosto, não abrindo mão de fazê-las
diversificadas ao ponto de agradar os mais exigentes leitores. Há tanta matéria
n’A Falência, que é impossível não se
agradar de pelo menos uma das múltiplas camadas da trama.
Alguns pontos, contudo, não me pareceram bem
executados. É curioso, por exemplo, que a infidelidade de Camila, sabida por
todos, fosse ignorada por Teodoro. A maneira por que Mário se comporta após o
casamento (incluindo a decisão de casar-se) também destoa de como nos é
apresentado seu caráter ao longo do livro. A postura resignada de Nina e sua
reação ao casamento do primo também me pareceram pouco convincentes.
A impressão final deixada por A Falência é mesmo de insaciedade.
Quando então finalmente se dá “a falência” aludida pelo título, o livro
subitamente acaba, deixando o leitor curioso pelo destino de personagens tão
queridos. A última cena então, embora de excelente escolha, chega a irritar
simplesmente por ser a última. No mais, se o livro de D. Júlia não é uma
obra-prima, esteve bem perto de sê-lo.
Avaliação: ★★★★
Daniel Coutinho
***
Instagram: @autordanielcoutinho
SKOOB: http://www.skoob.com.br/usuario/1348798Escreva para o blog: autordanielcoutinho@gmail.com
vlw man vc é foda
ResponderExcluir