O romance
nacional mais aclamado dos últimos anos é indiscutivelmente Torto Arado (2019), do baiano Itamar
Vieira Junior. O porquê dos tambores rufarem tão alto em torno deste livro é
que não posso compreender. Mas quem explica o sucesso? Essa loteria que, de
tempos em tempos, premia este ou aquele sem determinar métodos.
Torto Arado é
nitidamente o romance de um neófito das letras. Os primeiros capítulos são
carregados de um tom infantojuvenil, mas que não soa como recurso estilístico
proposital, e sim como texto em processo de autodescoberta, que ainda não tem
segurança do rumo que vai tomar. De fato, a narrativa me pareceu hesitante em
praticamente todo o livro.
A frase
simples de Itamar até que se esforça por atingir uma fluidez textual, mas a
falta de apuro em vários trechos e muitas ambiguidades bobas, por exemplo,
prejudicam bastante o ritmo. Se, por outro lado, o plano ficcional compensasse
esses defeitos, a impressão final poderia ser melhor, mas o enredo é tão
problemático quanto o texto.
Entendo que
a narrativa fragmentada, essa colcha de retalhos tão querida dos autores contemporâneos,
seja uma marca muito forte na literatura do nosso tempo. No entanto, tal
recurso, se não manejado por dedos de artesão, pode comprometer seriamente uma
obra literária.
Logo no
início do romance temos um exemplo claro dessa costura mal executada: quando o
episódio das gêmeas Crispina e Crispiniana interfere bruscamente o fluxo de uma
narrativa que teve um bom começo. Em seguida, quando a história de Bibiana já
ganhava um bom desenvolvimento, o foco muda para Belonísia e, daí por diante, a
meu ver, o livro se perde cada vez mais.
Outro ponto
delicado, ao qual não poderei dar o espaço merecido nesta resenha, é o
engajamento do texto. Em poucas palavras, toda literatura é livre para dizer o
que quer, mas sou dos que pensam que, quando a intenção artística não está em
primeiro plano, a obra literária tende a se descaracterizar. É o que ocorre com
Torto Arado, onde a militância não
aparece de forma sutil, mas nitidamente escancarada.
Há várias
passagens no livro que apostam por uma prosa poética, recurso que poderia ter
tido um efeito melhor, não fosse a impressão de estarem ali para suavizar a
pregação ativista de capítulos anteriores. No entanto, grave mesmo é quando a
mesma técnica é aplicada no desfecho do romance, a fim de pôr panos quentes no “olho
por olho” defendido na polêmica frase final.
Torto Arado é daquele
tipo de livro que poderia ter sido muito melhor, desde que outras escolhas
fossem tomadas na composição da obra. Não estou aqui para ditar as escolhas
certas para este ou qualquer outro texto que seja. Apenas reflito sobre
possibilidades diversas que teriam dado um acabamento mais satisfatório ao
romance, sem desmerecer seu mérito por ter (na forma concebida) funcionado para
tantos leitores.
Avaliação: ★★
Daniel Coutinho
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