sábado, 18 de maio de 2024

As Fatalidades de Dous Jovens, de Teixeira e Sousa - RESENHA #209

É impressionante o crescimento que podemos observar no início da carreira literária de Teixeira e Sousa. As Fatalidades de Dous Jovens, seu segundo romance, é demasiado superior a O Filho do Pescador, obra precursora do gênero no Brasil.

As Fatalidades foram publicadas pela primeira vez, em folhetins do jornal carioca O Mercantil, entre 29 de julho e 4 de outubro de 1846. Aqui temos o primeiro romance longo do autor, que curiosamente me pareceu menos prolixo que As Tardes de um Pintor e A Providência, publicados posteriormente. Diria mesmo que As Fatalidades de Dous Jovens é, dos quatro livros que li do autor, o mais fluido e de texto mais enxuto.

O ritmo deste romance também se destaca em relação aos outros. Os episódios são narrados objetivamente, especialmente na primeira metade. É outro ponto que gostaria de destacar: a superioridade da primeira parte em relação à segunda. Esta, embora não seja ruim, acaba sendo mais repetitiva e previsível, principalmente nos capítulos finais.

Os personagens estão bem delineados, e de modo geral são tipos simpáticos ao leitor. Mesmo as figuras secundárias, como Margarida, Mestre Estolano e Sebastião, têm uma participação interessante na narrativa. Por outro lado, um personagem de extrema relevância como Gonçalo acaba sendo negligenciado; está claro que o autor desejava criar uma aura de mistério em torno dele, deixando para o desfecho do livro o esclarecimento de suas ocasionais aparições; mas trata-se de um personagem tão interessante, talvez o maior do livro, que, a meu ver, daria conta de outro romance.

Acredito que os personagens de um livro estão bem construídos quando aguçam a curiosidade do leitor. Por diversos momentos, durante a leitura, eu desejava mais cenas deste ou daquela personagem, a fim de conhecer mais e, por consequência, ganhar proximidade. A própria Emília, enquanto protagonista, merecia mais espaço, especialmente no que se refere ao seu romance com Geraldino; o diálogo entre eles, mesmo por correspondência, é praticamente inexistente no livro.

Quanto ao enredo, este se fundamenta num grande clichê: o jovem casal cuja união é impossibilitada pela inimizade de seus pais. Felizmente, o livro não se limita a isso. Há uma diversidade riquíssima de outros elementos, envolvendo situações que acabam chamando mais atenção. O autor é minucioso em esclarecer fatos do passado, explicando o motivo de cada desavença, a presença de novos personagens, a ligação entre os mesmos, a tomada de certas decisões, etc.

Como pano de fundo dessa teia narrativa, outro destaque do romance é sua ambientação colonial, tão comum na obra de Teixeira e Sousa. O autor explora, além do momento histórico, a linguagem, os costumes e diversas outras marcas de época que transportam o leitor para o final do século XVIII. Há, por exemplo, um capítulo delicioso dedicado à descrição de um casamento na roça, que nos dá uma visão privilegiada das músicas com disputas entre cantadores, das danças entre pares, das comidas e do modo como eram servidas, além de muitos outros detalhes que documentam os costumes da época.

As Fatalidades de Dous Jovens é um belo exemplar do que era a escola romântica no Brasil. Quem aprecia os lances romanescos de um Joaquim Manuel de Macedo ou de um Bernardo Guimarães terá aqui uma nova iguaria de sabor diferenciado: um prato menos refinado, sem dúvida, mas ainda assim apetitoso.

Avaliação: ★★★

Daniel Coutinho

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