Finalmente chegamos
ao oitavo livro de “Anne”, o último da série publicado em vida da autora,
atentando-se para o fato de que Anne de Windy Poplars (1936) e Anne de Ingleside (1939) situam-se (na cronologia do enredo) antes de Rilla de Ingleside (1921).
De todos, este oitavo livro é o que mais destoa do conjunto, certamente por trazer o tenso pano de fundo da Primeira Guerra Mundial. A obra é um registro interessante de como a guerra interferiu no ambiente familiar. A autora, felizmente, não se concentra em descrever episódios de guerra, embora ela o faça indiretamente, seja pelos diálogos entre os personagens ou pelos registros no diário de Rilla Blythe.
Rilla de Ingleside, contudo, não é, como eu supunha, um livro leve e ameno como os anteriores. Aqui o clima é quase sempre tenso e de uma atmosfera pesada. Embora a autora não deixe de reproduzir os episódios divertidos e cômicos do costume, eles não dão alívio suficiente à obra, que se mantém num ritmo mais carregado.
É interessante como a autora expõe a indiferença dos personagens para com o episódio que, na verdade, seria o estopim da Grande Guerra. De fato, ninguém poderia prever que um assassinato em Saravejo poria o mundo em fervo e, muito menos, que as consequências do motim chegariam à tranquila Ingleside.
Jem é o primeiro a deixar a família, seguindo o exemplo de outros canadenses que já haviam se alistado para o combate. Walter vai em seguida e, por último, Shirley. Além deles, Kenneth Ford, o filho de Leslie e Owen, e que se torna o namoradinho de Rilla, também se candidata para lutar. E não poderíamos esquecer de Jerry e Carl, os filhos do reverendo Meredith, que também partem para a Europa.
Rilla de Ingleside concentra-se principalmente em como os moradores de Glen St. Mary reagem à guerra, principalmente no que se refere à preocupação para com os filhos e maridos que partiram em nome da pátria. Rilla, a suposta protagonista, embora esteja sempre às vistas do leitor, não é o ponto central da obra. Seu romance com Kenneth Ford, por exemplo, tem um espaço mínimo no livro. Sua realização mais importante no enredo é a missão que assume de cuidar de Jims Anderson, um órfão da guerra.
O maior problema do livro, portanto, talvez seja a escolha do título, que acaba gerando uma quebra de expectativa no leitor. Rilla de Ingleside não é sobre Rilla. É sobre como os horrores de uma guerra afetam uma família. É agoniante ver que os personagens dormem e acordam afetados pela preocupação, que a leitura do jornal diário é ansiada e temida ao mesmo tempo, que um simples toque de telefone acelera o coração de todos.
Já comentei por aqui minha aversão a livros com temática de guerra. Certamente por isso não consegui gostar tanto assim da leitura de Rilla. Mas é inegável que o livro me emocionou em diversos momentos e até me diverti com uma e outra situação. Se, por um lado, era sofrido contemplar o cãozinho Segunda-Feira numa espera incansável/improvável por Jem; por outro, era divertido como a dupla personalidade do gatinho Doc perturbava a hilária Susan Baker, cuja participação neste oitavo livro merece ser destacada.
Desconsiderando os livros de extras, a série “Anne” se encerra um tanto melancólica com este Rilla de Ingleside. Eu realmente esperava um desfecho mais digno e menos lutuoso. Mas, na verdade, a série como um todo foi uma sequência de quebras de expectativa. E com isso não quero dizer que esteja arrependido da leitura. Embora Montgomery não tenha se tornado uma autora favorita, acompanhar a trajetória de Anne, desde Green Gables até Ingleside, foi uma das experiências mais marcantes que já tive enquanto leitor.
Avaliação: ★★★
Daniel Coutinho
***
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