Frankenstein é dessas
obras que povoam nosso imaginário desde que nos entendemos por gente, mas,
quando finalmente nos aventuramos a ler o original, percebemos que o livro não
é nada daquilo que imaginamos até então. A princípio, para mim, foi uma experiência
feliz descobrir a história dessa forma, tão diferente, com propostas que vão
muito além da literatura de horror. Mas os caminhos do romance, assim como seu
protagonista, não me cativaram o bastante, de modo que esta não foi das
leituras mais agradáveis do ano.
A maior
qualidade de Frankenstein (1818) está
na escrita de Mary Shelley. O texto dela se mantém belo e agradável mesmo nas
passagens menos romanescas, como quando o foco está nos estudos e descobertas
científicas de Victor. Poderia citar uma dúzia de autores que seriam tediosos
na descrição de tais passagens. Talvez por ter crescido numa família de
intelectuais e até mesmo ter casado com um poeta, Mary fosse tão expressiva em
sua arte.
A primeira
metade do romance, que é menos deprimente, mantém-se num nível mais palatável.
O artifício de criar uma moldura para a narrativa através do capitão Walton dá
um charme a mais ao livro. Em seguida, quando passamos à história de Victor
Frankenstein, temos todos aqueles ingredientes da escola romântica que tanto me
fascinam, especialmente no que se refere à influência da natureza sobre a
trama. A autora nos transporta magicamente para os lagos suíços em noites
enluaradas.
O suspense
se mantém otimamente em torno da criação do ser ao qual Victor pretende
conferir vida. Mas sua postura covarde perante o êxito de seu trabalho, além de
acarretar consequências graves ao longo do enredo, fez-me antipatizar
imediatamente com o personagem.
A partir
daí, a presença de Victor em qualquer passagem prejudicava meu interesse pela
obra. Felizmente, na sequência, temos a narrativa da criatura, que constitui
boa parte do livro. Esse episódio é, contudo, um dos momentos mais deprimentes
do romance, onde a autora, de certa forma, joga com o emocional do leitor,
alimentando esperanças que logo se frustram.
Após a
leitura de Frankenstein, tive acesso
a uma resenha sobre o livro, escrita por Percy Shelley, o esposo da autora. Em
seu texto, Percy toca num ponto que eu já havia entendido como a mensagem
principal da obra: “Trate mal uma pessoa e ela se tornará perversa”. Acredito
que o mais triste em Frankenstein é
que nenhum personagem tenha sido de fato gentil com a criatura. O próprio cego
De Lacey, que poderia ser apontado como uma exceção, jamais teria demonstrado
gentileza perante a imagem monstruosa da criação de Victor. E este, o único que
poderia facilitar os caminhos da criatura perante a humanidade, não teve caráter
suficiente para assumir as consequências de seus atos. Um perfeito covarde.
Vocês devem
ter percebido o quanto este livro me deixou irritado, e isso certamente
interferiu na minha avaliação final. Eu, porém, jamais poderia negar o talento
de sua autora: a beleza de sua escrita, a capacidade de pintar cenários
inspiradores, a construção de atmosferas condizentes com cada passagem, dentre
outros méritos inegáveis. Mas a tragicidade do livro, a meu ver bastante
exagerada, acaba comprometendo o resultado final do romance. As várias mortes
que se vão acumulando deixam a obra um tanto artificial, embora isso seja
desculpável numa obra romântica.
Avaliação: ★★★
Daniel Coutinho
***
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